Certa vez eu li uma notícia sobre uma baleia solitária. Um dos pesquisadores entrevistados explicou que as baleias se agrupam e se comunicam através de um canto, e que esse canto tem uma frequência específica. E a tal baleia solitária cantava em outra frequência, uma muito mais grave.

Lembro que fiquei muito compadecido dessa baleia. Será que não tem um jeito de ajudá-la? Levá-la até um grupo? Seria isso suficiente, ou ela se perderia de novo? Tem como ensiná-la a cantar no tom?

Acho que fiquei sensibilizado além da medida porque sou um pouco desafinado. Quando tenho que cantar com meu grupo de contadores de histórias, sempre vou para o lado do meu amigo @jpbrum, que canta bem perto do meu ouvido, para eu tentar cantar no tom. Eu não sei se você já experimentou cantar junto com um grupo, mas é uma das coisas mais fantásticas da vida. É uma emoção indescritível. E eu amo meus amigos contadores de histórias que, mesmo após anos de desafino, sempre têm paciência e me ajudam a cantar no tom escolhido.

Mas eu fiquei pensando nisso: em quantas vezes somos preteridos nos grupos por não estarmos no mesmo tom. Será que é isso que define um grupo? Um grupo seriam pessoas que cantam-conversam-vivem no mesmo tom? Acredito que muitos responderiam que “não, claro que não! Os grupos comportam a diversidade!”. A realidade, contudo, nos mostra que a exclusão sempre espreita os que não se adequam. 

O quão abrangente é essa metáfora? O quão ingênua?

Eu realmente queria que a tal baleia fizesse amigos. Para que ela pudesse experimentar algo além da solidão. 

No filme da Pixar que eu roteirizo em minha cabeça enquanto escrevo essa crônica, a baleia solitária faz uma jornada para aprender a cantar no tom adequado. Encontra amigos, amores, família. No clímax, desafina um pouco, todos estranham, e ela teme perder tudo o que acabara de conquistar. Mas alguma outra baleia (que a ama), diz: “esse seu outro jeito de cantar é tão lindo! Talvez não seja tão grave cantar tão grave…”. A gente dá aquela choradinha. A música dos créditos é o João Gilberto cantando “é que os desafinados também têm um coração…”.

THE END (the beginning)

As crônicas com a tag “Isso foi uma pergunta?” são escritas pelo Ulisses Belleigoli e também estão disponíveis no perfil do Instagram @aquinavaranda.

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