Minha história com o café…

Primeiro: dizer “trabalhe com aquilo que ama que nunca trabalhará um dia” é a maior mentira que já te contaram. Trabalho é trabalho, eu sou muito atenta e a seriedade que minha profissão me pede é alta. Como trabalho com Café de Especialidade me exijo uma nota bem acima da média. 

Começo com um desabafo: Não é uma área que o Brasil respeita; nosso povo não está ligando a mínima para o que está comendo e bebendo. Nosso povo, sofrido, está interessado sim, em quanto custa. E não só a bebida, mas a produção também. Então é desafio atrás de desafio. E bem, na minha opinião, nem todos tão deliciosos quanto uma xícara de fato é.

Mas, quem sou eu? Sou a Priscila Pinho, tenho 26 anos, e meu relacionamento com café começa ainda quando pequena, na cozinha da casa da vó, quando, antes de ir pra escola, eu tomava café com leite, e meu vô, café puro. Eu achava o cheiro incrível, mas só; eu não tinha de fato um amor pela bebida.

(Importante dizer que essa qualidade do café que temos nos mercados – e que eu tomava na casa dos meus avós – não é boa, como digo sempre: ali tem tanta coisa que tem até café. Cuidado, é uma questão de saúde.)

Foi há cinco anos que, em uma das férias das faculdades – inquieta que sou – que fui estudar sobre barismo no Rio de Janeiro, na Casa do Barista, onde hoje também trabalho dando aula.

Há cinco anos, eu cheguei correndo da minha cafeteria favorita da cidade em que nasci e falei pra minha mãe que eu queria fazer um curso de café! Meu vô me olhou e disse, resmungando: “bobaaagem, vamos ali pro fogão que te ensino tudo”. Sorte a minha ter a mãe que tenho, que me impulsiona em todas as minhas vontades de aprender algo novo. Então lá fui eu.

Lá fui eu passar 5 dias falando sobre café e, enquanto ia, eu ia pensando: “o que é que esse professor vai falar pra gente durante 5 dias direto sobre CAFÉ?! Não é possível que a gente tem tanta coisa assim pra falar de um pó que a gente coloca no coador e põe água… não parece nada complicado”. 

Nesse ano eu estava completamente imersa na área acadêmica, estudando filosofia, antropologia, sociologia, artes, linguagem, e todas as outras humanidades que o Bacharelado de Ciências Humanas da UFJF me permitia, e também estudava comunicação/jornalismo no CES/JF. Andava lotada de livros, escrevia artigos científicos, trabalhava com arqueoastronomia no Centro de Ciências da Federal e fazia alemão. Eu me imaginava seguindo na área de pesquisa, óbvio.

Nem podia imaginar que minha vida mudaria e que não seria apenas uma esquina a ser virada, ou um novo tópico no caderno, ou mais uma matéria legal pra ler algum outro livro e encaixar nas pesquisas. Seria uma nova forma de expressar vida, de gritar minha potência no mundo, ainda que em silêncio; de abrir um portal dimensional na frente de alguém com uma simples xícara a ser entregue. Sem. Precisar. De. Uma. Palavra. 

Eu me redescobri: quando entrei na casa do curso, durante as aulas, a todo pó de café, a toda delicadeza que eu subestimei, a cada tentativa de mexer na máquina de espresso e no moinho. Eu me redescobri.

Hoje, quando eu dou aula, começo com: “Galera, café é uma palavra muito pequenininha pra dizer o que é de fato; nos dirigimos à bebida, mas antes ele é fruta e tem um ciclo lotado de etapas que pedem atenção, cuidado e acompanhamento diário, todos os dias do ano, a todo instante”. 

E ali, enquanto nascia uma outra Pri, toda confusa e alegre, de olho brilhante, redescobrindo a vida, na euforia, me vi fazendo um novo curso de café com certificação internacional a cada férias que aparecia. Minha paixão pela área acadêmica ficou um pouco de lado, mas não esquecida: me formei e logo me vi trabalhando com os grãozinhos…

Sim, temos uma infinidade de cursos! Coar café é uma das possibilidades, mas temos muitos outros profissionais na área. Comecei como Barista, o profissional que cuida da xícara final a ser entregue na mais alta qualidade do grão, mas descobri que meu coração pulsa pela produção, pelas fazendas, pela troca da monocultura pela diversidade, por ajudar o produtor, quem colhe, quem roda o café no terreiro, a entender sobre o que buscamos em termos de sabor em uma xícara elegante no café de especialidade.

Moro na Fazenda Cachoeira, em Minas Gerais, pelo menos durante um mês no ano, para acompanhar a colheita, rodar café, ajudar no que posso e aprender sobre Solo Vivo, Plantação Orgânica, e para degustar os cafés da safra nova.

Já morei em São Paulo, onde atendia mais de 60 produtores de café, que foi quando comecei a visitar as fazendas e a perceber como meu coração me gritava para estar exatamente ali. Viajei para vários estados produtores, com o maior amor do mundo em ver que nosso Brasil é o maior produtor dessa Terra inteira (e acredito que com alguns detalhes e muito trabalho, nós podemos ser uma potência que integra ser humano e natureza).

Agora, aqui entra John Lennon cantando talvez… muitas pessoas me chamam de sonhadora, que isso não vai acontecer, que o capitalismo está aí e é tudo predatório mesmo. Eu não concordo e vou tentar fazer diferente do que temos visto até agora; com certeza, eu vou. Eu vou tentar porque nossas fontes de água estão secando, nossa qualidade de ar piorando, estamos cada vez mais envenenados sem saber, cada vez mais sugando o solo e desertificando áreas imensas. E pra quê? Para chegar com tudo no limite? Não comigo.

Trabalhar com a xícara e com os clientes em uma cafeteria é muito legal, mas todo o trabalho por trás dessa loja precisa acompanhar o trabalho no campo, e isso não está acontecendo. E não é por falta de tecnologia que não conseguimos disseminar a ideia, é por falta de gente que não acredita que vai mudar e que vai dar certo. Eu não sou agrônoma, e nem quero ser, e muito menos pegar o trabalho deles pra fazer. Eu estou apenas tentando fazer com que as coisas sejam um pouco mais vivas e menos sintéticas, para nosso bem estar e sobrevivência.

Bem, está aí um pouco da minha história com o café. Ainda sou apaixonada pela área acadêmica, jamais deixarei de estudar. Mas sou ainda mais apaixonada por café, por natureza, por pessoas, pela vida. 

Tenho um grande professor nessa jornada, que trabalho junto comigo na La Marzocco Brasil, o Paul, que diz “Pri, não se preocupe, uma xícara nunca mente e ela fala não só da extração, mas do ciclo inteiro. Faça seu trabalho bem feito que está tudo certo!” 

Estou a cada dia me aprimorando em fazer cafés incríveis, a cada produtor que visito, a cada mesa de degustação, a cada saca comprada e vendida, e a cada dia descobrindo o quanto de trabalho ainda tenho pra fazer! Ihuuuul! 

Se quiser acompanhar meu trabalho, entrar em contato comigo, mandar um oi que seja, me segue no Instagram! @coffeebreak_pri

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