ArteCinemaProva dos 9

9 FILMES PARA PENSAR SOBRE ARTE

Não tem nada mais triste que perguntar para alguém sobre um artista ou obra preferidos e receber Van Gogh ou Monalisa como resposta. Nada contra, até acredito que essas possam ser escolhas bacanas, mas será que elas têm mesmo a ver com os lendários tons de amarelo ou com o sorriso que intriga o mundo da arte há mais de meio milênio? Ou essa é uma resposta rápida, que aparece pela falta de um repertório mais largo?

Somos analfabetos de imagens, já dizia uma professora minha (e não só de imagens, ouso dizer). Crescemos com a ideia de que arte não é algo da ordem do dia, que para entender sobre arte tem que ser PhD ou muito bicho-grilo. Mas a verdade é que a arte é uma forma incrível de conhecer o mundo, de entender o outro, de ter acesso a novas formas de ver as coisas. Então, para começar a tirar esse atraso, preparei uma listinha de 9 filmes (ficcionais, documentários, curtas) que apresentam alguma discussão sobre arte, seja de forma explícita ou diluída nas histórias que contam.

1. The Square: A Arte da Discórdia

Vencedor da Palma de Ouro em 2017 e um dos candidatos a melhor filme estrangeiro do Oscar 2018, The Square é imprevisível e cheio de momentos marcantes. A história gira em torno de Christian, o curador de um museu em Estocolmo, que tem o seu discurso sobre a arte colocado em xeque ao longo de diversas situações tragicômicas. O filme aborda de maneira muito simples (em alguns momentos, é até um pouco literal além da conta) a relação entre obra de arte e museu, público e artista, centro e periferia, fazendo referências e críticas à teoria da arte relacional e expondo um lado interessante do mundo artístico que geralmente fica de fora nas cinebiografias de artistas e até nos documentários.

The Square: A Arte da Discórdia (de Ruben Östlund, Suécia, 2017)

2. Pina

Um dos meus documentários preferidos de todos os tempos, Pina é um retrato muito sensível sobre dança, arte e artistas, além de ser, ele mesmo, uma obra de arte. Wim Wenders registra coreografias consagradas da companhia alemã liderada por Pina Bausch (que faleceu poucos dias antes do início das gravações) e entremeia as cenas de dança com as falas dos bailarinos, em uma estrutura solta, sem perguntas estruturadas, e em diversos cenários diferentes (todos de tirar o fôlego). O filme é uma oportunidade incrível de aprender sobre as relações entre arte e corpo, arte e espaço, a relação entre artistas e entre diferentes mídias.

Pina (de Wim Wenders, Alemanha, 2011)

3. As Estátuas Também Morrem

Por que as máscaras africanas estão no Museu do Homem e não no Louvre? Ou melhor, por que elas estão em um museu? O curta documentário As Estátuas Também Morrem (que é uma espécie de ensaio cinematográfico) foi encomendado pela revista Présence Africaine, uma publicação que surgiu no fim da década de 1940, em Paris, e tinha como objetivo dar uma resposta a essas perguntas a partir de uma perspectiva pós-colonialista. O filme pode ser encontrado no Youtube e, apesar de ter sido feito há mais de 50 anos, levanta questões super atuais sobre as relações entre arte e cultura, os impasses etnográficos envolvendo objetos tirados de seus contextos e o papel dos museus diante desses novos questionamentos.

As Estátuas Também Morrem (Alains Resnais, Ghislain Cloquet e Chris Marker, França, 1953)

4. Cópia Fiel

Você preferiria ter uma obra de arte original ou uma cópia? Uma pergunta que parece boba, a princípio, é o que embala o roteiro de Cópia Fiel, em que os protagonistas James e Elle passeiam por ruas da Toscana enquanto conversam sobre teorias da arte e visitam galerias, colocando à prova o argumento de James de que, talvez, a cópia seja tão ou mais importante que seu original. Mas a discussão de arte do filme ultrapassa os debates teóricos e as referências artísticas, passando a fazer parte da própria estrutura narrativa e levando o espectador a se questionar sobre o que é mentira e o que é verdade, sobre ficção e real, sobre cópia e original. Um filme delicioso, com um roteiro impecável e atuações incríveis.

Cópia Fiel (Abbas Kiarostami, França, 2010)

5. Visages Villages

A incrível cineasta Agnès Varda se junta ao jovem fotógrafo JR para uma viagem de 18 meses por várias cidades francesas, nas quais se encontram os verdadeiros protagonistas do filme: pessoas comuns com quem os artistas interagem e trocam histórias e que, ao final do encontro, são fotografadas e estampadas em grandes formatos nas fachadas dos prédios, em veículos, galpões e muros, tudo com o auxílio de um caminhão-cabine fotográfica, que acompanha os artistas em toda a expedição. O documentário é uma celebração do encontro artístico entre duas gerações (Agnès e JR têm mais de 55 anos de diferença de idade) e também um ótimo exemplar do fazer artístico que ultrapassa as fronteiras dos museus e das galerias e que nasce de uma interação real com o público e com seu próprio “objeto”.

Visages Villages (JR e Agnès Varda, França, 2017)

6. Pendular

Um casal de artistas, escultor e bailarina,dividindo um galpão e a vida, em um jogo que está sempre oscilando entre instabilidade e equilíbrio. A história, que foi inspirada na performance Rest Energy, de Marina Abramovic, é o combustível não só do filme, mas também de diversas esculturas e coreografias, que foram desenvolvidas em parceria com outros artistas para compor os personagens e as cenas. Pendular é uma ótima pedida para aprender sobre a tênue linha que geralmente existe entre vida e arte, entre real e ficcional, e também para entender o papel dos processos criativos na concepção das obras/performances.

Pendular (Julia Murat, Brasil, 2017)

7. Manifesto

Concebido como uma instalação de arte, Manifesto é a versão para o cinema de 13 curtas-metragens dirigidos pelo artista plástico Julian Rosefeldt. Cada uma das cenas é uma espécie de dramatização de 13 manifestos famosos que se relacionam de alguma forma com o campo da arte, como o Dogma 95, o Manifesto Fluxus e o Situacionista. O filme é uma maneira interessante de ter contato com as teoria da arte mesmo para quem ainda não é familiarizado com o campo e a razão é simples: não é todo dia que você vai ter ninguém mais, ninguém menos que Cate Blanchett, vestida de punk, te explicando o Manifesto Realista enquanto fuma um cigarro.

Manifesto (Julian Rosefeldt, Alemanha, 2015)

8. High Rise

A discussão sobre Arquitetura ser ou não arte talvez nunca tenha um fim e High Rise é um ótimo meio de entender o porquê. Adaptado do livro homônimo de J. G. Ballard, o filme acompanha o Dr. Robert Laing, o recém-chegado morador de uma torre de luxo de quarenta andares nos arredores de Londres. Em uma referência clara à estética brutalista e aos diversos conjuntos modernos da década de 60/70, que tinham como marca registrada o projeto de um estilo de vida e não apenas o desenho da moradia, High Rise apresenta os conflitos entre realidade e desenho e expõe os dilemas e as hipocrisias da profissão através do personagem do arquiteto, representado no filme por Jeremy Irons.

High Rise (Bem Wheatley, Reino Unido, 2015)

9. Tatuagem

Representando o teatro e a performance, Tatuagem merece um lugar nessa lista não apenas pela discussão sobre arte como forma de resistência política, mas também por ser um dos filmes nacionais mais legais dos últimos tempos. Os personagens Clécio e Fininha nos conduzem pelo nordeste brasileiro, em plena ditadura militar, e apresentam a trupe do Chão de Estrelas, um teatro/cabaré que desafiava as normas morais e a censura do regime através de um fazer artístico que não se limita aos palcos, mas se torna uma forma de vida, um cotidiano. Filme importantíssimo para entender mais sobre a relação entre arte e política e para combater o revisionismo histórico (agora, institucionalizado) sobre a ditadura militar brasileira.

Tatuagem (Hilton Lacerda, Brasil, 2013)

Isadora Monteiro é urbanista e arquiteta, pesquisadora da vida nas cidades e mineira de carteirinha. Adora ler mulheres, só vê filme triste e sonha todos os dias com a revolução feminista.

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